comorosasdeareia

palavras...como "rosas de areia" ou "flores do deserto"...

domingo, janeiro 29, 2006

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ARTE POÉTICA COM CITAÇÃO DE HOLDERLIN

O poema lírico nasceu de uma roseira. Não
digo que fosse a rosa de cima, aquela que todos
olham, primeiro que tudo, pensando
em cortá-la para a levarem consigo. É
a rosa nem branca nem vermelha, a rosa pálida,
vestida com a substância da terra
a que toma a cor dos olhos de quem a fixa, por
acaso, e ela agarra, como se tivesse
mãos abstractas por dentro das suas folhas.
Colhi esse poema. Meti-o dentro de água,
como a rosa, para que flutuasse ao longo de um rio
de versos. O seu corpo, nu como o dessa mulher
que amei num sonho obscuro, bebeu a seiva
dos lagos, os veios subterrâneos das humidades
ancestrais, e abriu-se como o ventre da
própria flor. Levou atrás de si os meus olhos,
num barco tão fundo como a sua própria
morte.
Abracei esse poema. Estendi-o na areia
das margens, tapando a sua nudez com os ramos
de arbustos fluviais. Arranquei os botões
que nasciam dos seus seios, bebendo a sua cor
verde como os charcos coalhados do Outono. Pedi-lhe
que me falasse, como se ele só ainda soubesse
as últimas palavras do amor.
(Metáfora contínua de um único sentimento).

Nuno júdice

quinta-feira, janeiro 12, 2006



INSULAR

Entre o outono e a neve

construí uma ilha

e deixei correr nos meus olhos

a véspera de um rio

e a linguagem absurda das ideias

com identidade suspeita.



Na vertente do corpo

havia um lugar frágil,

onde o cheiro das maçãs

se transformava em orvalho

e as mãos escorregavam

pelo lado morno da voz,

até à represa de um chamamento azul.



Vim do lado sul

de todos os caminhos

que vão dar à sede.



Conheci a turbulência

de um verão intacto

e desenhei a curva

incontornável da lua cheia.

Graça Pires


segunda-feira, janeiro 02, 2006


MESA DE SONHOS

Ao lado do homem vou crescendo

Defendo-me da morte quando dou
Meu corpo ao seu desejo violento
E lhe devoro o corpo lentamente

Mesa dos sonhos no meu corpo vivem
Todas as formas e começam
Todas as vidas

Ao lado do homem vou crescendo

E defendo-me da morte povoando
de novos sonhos a vida.

Alexandre O'Neill