Sem mais nem menos
surgiu o passado,
corpo intranquilo
feito de sons semelhantes
aos rostos que amei,
universo donde me excluí,
mar desprovido de cais
na obliquidade dos contrastes.
Esta noite voltei à minha infância:
menina rosada de sonhos nos bolsos,
bailarina de corda na caixinha de som.
À infância regressa-se solitariamente,
subindo um rio sem margens,
até ao lugar em que a nascente
se confunde com o tempo
e o tempo se transforma em espanto.
Procuro, teimosamente,
o rasto da brisa
que me invade o corpo
e apenas sei que o sonho
é um risco inquietante,
quando a solidão tem rosto
e se conhece a posição das estrelas
no âmago das palavras.
Reinicio a infância
no esboço do poema
e circunscrevo o litoral
fragmentado do que sou.
Quem foi que descodificou
o céu no meu olhar
e me deixou na alma
um deus imaginado?
Quando o espaço do sonho é circular
como o tempo das cerejas,
ou da migração dos pássaros
que fendem o infinito,
inadiado é o rito da poesia.
Se eu fosse uma gaivota, dançaria
na proa dos veleiros
até à hipnose
de abraçar a maresia.
8 Comments:
At 11:44 da manhã, wind said…
Tu "matas-me" com estes belísimos poemas de Graças Pires. Adoro esta poetisa que descreve tão bem os sentimentos, as recordações. Beijos e boa Páscoa:))**
At 11:45 da manhã, wind said…
Correcção:belíssimos:)
At 8:40 da tarde, JPD said…
Um poema extraordinário.
Bom, belíssimo regresso.
Desejo maior assiduidade. Valeu?!
Bjs
At 11:09 da tarde, Sandra M. S. Sousa said…
Adoro poesia.
Acho que esta fopi uma excelente sugestão!Bjs
At 4:48 da tarde, Manel do Montado said…
Escolha excelente e bem cheia de recordações de todas as infãncias.
beijo e bom FDS
At 10:37 da tarde, Å®t Øf £övë said…
Maria,
Bonito este poema que escolheste para partilhar connosco.
Gostei de ler.
Bjs.
At 4:11 da tarde, M.P. said…
Olá, Maria! Tenho passado para te ler... não me tenho esquecido de ti. Aproveito para te desejar uma ÓPTIMA Páscoa, e um pedido de desculpas à "greve" aos comentários... Beijinho
At 5:16 da tarde, Anónimo said…
Também eu regresso aqui, a este espaço de sonho. Porque a poesia é para assimilar assim, dada com a tua generosidade.
Beijinhos, Maria.
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