comorosasdeareia

palavras...como "rosas de areia" ou "flores do deserto"...

quinta-feira, junho 30, 2005

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AUTO RETRATO
Espáduas brancas palpitantes:
asas no exílio dum corpo.
Os braços calhas cintilantes
para o comboio da alma.
E os olhos emigrantes
no navio da pálpebra
encalhado em renúncia ou cobardia.
Por vezes fêmea. Por vezes monja.
Conforme a noite. Conforme o dia.
Molusco. Esponja
embebida num filtro de magia.
Aranha de ouro
presa na teia dos seus ardis.
E aos pés um coração de louça
quebrado em jogos infantis.

Natália Correia

quinta-feira, junho 23, 2005

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S. JOÃO BONITO

São João Santo Bonito
Bem bonito que ele é
Bem bonito que ele é
Com os seus caracois d'ouro
E o seu cordeirinho ao pé
E o seu cordeirinho ao pé
Não há nenhum assim
Pelo menos para mim
Nem mesmo o S. José.

Santo António já se acabou
O S. Pedro está-se a acabar
S. João, S. João, S. João,
Dá cá um balão para eu brincar

segunda-feira, junho 13, 2005

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Morreu Eugénio de Andrade.
Morreu, de facto, mas deixou de si o essencial…
A sua alma de poeta ficou entre nós para sempre,
que de palavras também se faz a eternidade…
Não me apetece dizer “Paz à sua alma” ou “ Que Deus lhe dê o eterno descanso”.
Prefiro dizer:
- Que “Deus” o tenha…

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Onde me levas, rio que cantei,
Onde me levas, rio que cantei,
esperança destes olhos que molhei
de pura solidão e desencanto?
Onde me leva?, que me custa tanto.
Não quero que conduzas ao silêncio
duma noite maior e mais completa.
com anjos tristes a medir os gestos
da hora mais contrária e mais secreta.
Deixa-me na terra de sabor amargo
como o coração dos frutos bravos.
pátria minha de fundos desenganos,
mas com sonhos, com prantos, com espasmos.
Canção, vai para além de quanto escrevo
e rasga esta sombra que me cerca.
Há outra fase na vida transbordante:
que seja nessa face que me perca.

Eugénio de Andrade

sábado, junho 04, 2005

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Sinais Que No Amor Se Adiantam


No teu olhar se esfuma e desvanece
A cidade onde o corpo por enquanto é preciso.
É quando a outra face do luar aparece
E o balir das ovelhas tem o som do meu riso.
Para tapar meu seio já nenhum astro tece
A roupa com que outrora saí do paraíso.
O pudor é da terra. Só por isso anoitece
E a nudez dos amantes é não darem por isso.
A semente do filho que em nós amadurece
Trouxe-a no bico a pomba que o seu reino prepara.
Por isso na cidade já ninguém nos conhece
Pois que ambos trazemos esse filho
na cara.

Natália Correia